sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.01.2012

Insolvência
Exoneração do Passivo Restante
Prejuízo
Credor
Juros de Mora



“I) - A exoneração do passivo restante, inovadoramente introduzida no direito insolvencial português pelo CIRE, regulada nos arts. 235º a 248º daquele diploma, apenas é conferida a insolventes que sejam pessoas singulares.
II) Como resulta do Preâmbulo do diploma legal – “O Código conjuga de forma inovadora o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica. O princípio do fresh start para as pessoas singulares de boa fé incorridas em situação de insolvência, tão difundido nos Estados Unidos, e recentemente incorporado na legislação alemã da insolvência, é agora também acolhido entre nós, através do regime da exoneração do passivo restante”.
III) Resulta do art. 1º do CIRE  que o processo de insolvência é um processo de “execução universal” que visa acautelar os interesses dos credores, da economia e não despreza, a título excepcional, os interesses do insolvente pessoa singular.
IV) Na lógica de que  a exoneração é “uma segunda oportunidade” (fresh start), só deve ser concedida a quem a merecer; a lei exige uma actuação anterior pautada por boa conduta do insolvente, visando evitar que o prejuízo, que já resulta da insolvência, não seja incrementado por actuação culposa do devedor que, sabendo-se insolvente, permanece impassível, avolumando as suas dívidas em prejuízo dos seus credores e, não obstante, pretende exonerar-se do passivo residual requerendo a exoneração.
V) - Essa exigência ética, assente numa actuação de transparência e consideração pelos interesses dos credores, está claramente prevista na al. b) do art. 238º do CIRE, cujo objectivo é obstar que a medida excepcional da exoneração do passivo não beneficie o infractor.
VI) - São fundamentos autónomos de indeferimento liminar, a apresentação do pedido fora de prazo – al. a) do mencionado normativo – e que a não apresentação atempada cause prejuízo para os credores – al. d).
VII) – Os requisitos tempestividade e prejuízo para os credores são autónomos, já que a apresentação do insolvente pode não causar prejuízos sensíveis aos credores, como está implícito na al. d), mal se compreendendo que prejuízos insignificantes fossem motivo suficiente para a recusa liminar do pedido, por esse prejuízo ser de presumir em virtude da pretensão do insolvente ser requerida fora do prazo legal.
VIII) - A ratio legis do instituto da exoneração  é  evitar o colapso financeiro do insolvente pessoa singular, implicitando uma moderada transigência com a apresentação intempestiva, ligando-a, apenas reflexamente, ao facto dessa omissão poder ser causadora de prejuízo para os credores.
IX) O conceito de prejuízo, deve ser interpretado como patente agravamento da situação dos credores que assim ficariam mais onerados pela atitude culposa do insolvente.
X) A apresentação tardia do insolvente/requerente da exoneração do passivo restante, não constitui, por si só, presunção de prejuízo para os credores – nos termos do art. 238º, nº1, d) do CIRE – pelo facto de, entretanto, se terem acumulado juros de mora – competindo aos credores do insolvente e ao administrador da insolvência o ónus de prova desse efectivo prejuízo, que se não presume.”

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